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Em cada um de nós existe um poema .
Um por escrever ... um escrito que se quer procurado e se mantêm escondido na alma ... no coração.
Ser poeta ... não é escrever poemas.
É saber descobrir na poesia ... a parte que falta em si, a parte que falta ... nos outros .
Urbano Gonçalo
Em cada um de nós existe um poema .
Um por escrever ... um escrito que se quer procurado e se mantêm escondido na alma ... no coração.
Ser poeta ... não é escrever poemas.
É saber descobrir na poesia ... a parte que falta em si, a parte que falta ... nos outros .
Urbano Gonçalo
segunda-feira, 13 de setembro de 2010
Excerto do meu romance "Genéve" (16)
Nat regressava de um passeio pelas redondezas (lojas!), olhei os sacos que trazia, e perguntei-lhe:
- Deixas-te alguma coisa nas lojas?
- Só trouxe umas coisitas que até estavam muito em conta! Algumas até são para a Verónica!
- Então pelos vistos não é só a gasolina que é mais barata por cá!
- Não é mesmo! Olha vou ao quarto levar isto tudo e volto para o jantar, tá bem?
- Sí, hija!
Nat sorriu e disse :
- Vê se nos arranjas a mesma mesa de ontem!
- Está lá uma velha senhora!
- Então usa o teu charme!
- Ela deve ter aí mais uns vinte anos do que eu!
- Então usa-o todo, eu volto já!
Nat subiu e eu dirigi-me à varanda, felizmente para mim a velha senhora já estava de saída e eu lá apanhei a mesa, pouco depois Nat voltava com uma nova indumentaria.
- Uau!! - exclamei.
- Bem, vejo que usas-te o teu charme! - disse ela fazendo-se despercebida.
- Não foi preciso, tenho de confessar.
- Sim?!!
- Bastou-me dizer-lhe que havia uma bomba cá no restaurante.
- E ela saiu a correr, imagino!
- Não podia, por causa das muletas!
Começamos de novo na risota, depois ela perguntou:
- Já pediste? Estou esfomeada!
- Não! Estava à tua espera, mas pensei em " Paella", há bocado vi trazerem para aquela mesa uma.
- Em Roma sê romano?
- Mais ou menos isso, só trocamos o nome à cidade!
- Muito bem, então venha ela.
Enquanto esperávamos pelo jantar continuamos na conversa.
- E para além de lojas de roupa e calçado, não viste mais nada de jeito?
- De jeito? Tipo o quê, por exemplo?
- Tipo alto, moreno, talvez musculado!
- Lá vem ele outra vez com a mesma "lenga-lenga", estou a ver que tu com a minha idade, era só "brincadeira"!
Fui obrigado a rir novamente.
- Bom, nada de especial, para ser franco nem era muito de andar por aí atrás das raparigas.
- Não? Nunca houve nenhuma que te tirasse do sério?
- Do sério? Bem, todos nós mais tarde ou mais cedo temos o nosso primeiro amor claro! Esse tal que inevitavelmente fica para sempre na nossa memória, até porque por vezes só um dos intervenientes está apaixonado e o outro está "noutra"!
Daí o primeiro amor ter normalmente aquele significado, aquela áurea de desgosto porque ou é correspondido breve e fugaz, ou então não o é e fica para sempre marcado pela tristeza da primeira rejeição.
- Então e no teu caso, qual das hipóteses foi?
- Estou sob interrogatório?
- Sim! Vá lá, tu é que começaste!
- Está bem! Por acaso ainda há algum tempo atrás, tu me fizeste recordar dela.
- Eu?!!
- Sim, quando estávamos na galeria a estrear a tua máquina nova de café, contaste-me um pouco da tua história e da dos teus pais, e isso deixou-me a pensar em muitas coisas que me escapavam até à data.
- Lembro-me de uns pasteis! - sorriu Nat.
- É verdade, ainda aqui andam na minha cintura, mas enfim, ... tudo bem, eu vou contar-te a minha história.
O meu primeiro amor (o tal!) vivi-o em França, era ainda muito jovem e também eu rumei a esse paraíso da arte, sobretudo da pintura como sabes. Fui em busca de inspiração para os meus quadros e reconhecimento num país onde a cultura era e é, muito mais aberta do que a do nosso (meu) país. Ali passei os meses de Primavera e Verão até se acabar o dinheiro e ela desaparecer.
- Ela a inspiração? - perguntou Nat.
- Não, ela a minha musa.
- Como era ela?
- Era muito linda, de corpo frágil, cabelos castanho claro e uns olhos castanhos avelã lindos, assim parecidos com os teus. Andávamos sempre de mãos dadas junto ao cais quando o sol se punha ao final do dia, e a luz do pôr-do-sol tornava-a ainda mais bela. Gostava de adormecer no meu colo como se fosse uma criança, e eu ficava encantado a vê-la dormir enquanto brincava com os seus caracóis.
Durante o dia eu pintava com ela a observar-me pois gostava de me ver fazê-lo, enquanto por seu turno fazia pequenas peças de escultura de tudo o que lhe vinha parar às mãos. Fosse madeira ou pedra, conseguia fazer sempre dali, um boneco ou algo do género.
Nat olhava-me muito atenta e fixamente nos olhos como que a tentar ler o meu pensamento, enquanto eu falava e viajava mentalmente no tempo.
- Era francesa ela?
- Não, era portuguesa, mas vivia à muito tempo em França com a sua mãe.
- E como se chamava esse amor misterioso então?
- Bom, ao certo não sei, nunca soube!
- Não sabes? Como?!!
- Eu sei que é difícil de compreender, mas nós na altura éramos uns miúdos, ao fim e ao cabo, eu estava de passagem e ela aparecia sem avisar, supostamente quando a sua mãe viajava em negócios. Havia entre nós toda uma aura de mistério que juntamente com o ambiente que se vivia em Paris naquela altura de quase "Belle Époque" se unia numa combinação perfeita que nós sabíamos ser a chave para o nosso amor, nunca me disse o nome, nem queria saber o meu, decidiu dar-me um e chamou-me Paris, eu chamei-lhe Genéve por causa de um pingente em ouro com um monograma "G" que um dia achei e lhe dei todo contente.
Enfim, eu sei que tudo isto, agora passados estes anos todos parece uma estupidez, mas naquela altura nós sabíamos viver um sonho e como tal, só queríamos vivê-lo enquanto pudesse-mos, e assim fizemos até ao dia da nossa separação.
- Zangaram-se? - Nat estava em pulgas com a história.
- Não, não nada disso! Um dia já perto do fim do Verão, regressava eu ao meu quarto na pensão todo contente por ter vendido dois quadros e ansioso por a ver, pois ela sempre me apoiou muito, e tudo o que encontrei foi um grande vazio. Pura e simplesmente nunca mais a vi, e no entanto por todo o lado a procurei, mas sempre em vão. Esgotado o dinheiro e sem a minha musa senti-me perdido e voltei para Portugal, até hoje nunca mais fui a França tal foi o meu desgosto.
- Nunca mais tiveste notícias dela?
- Passado quase meio ano, recebi por intermédio de um amigo a quem deixei o quarto na pensão, um bilhete que alguém lá deixou para mim. Mas como eu já tinha regressado, ele enviou-mo para Portugal, o que ainda demorou um pouco mais o bilhete a chegar às minhas mãos. Eu li-o cheio de esperança mas na realidade ele só serviu para me desesperar ainda mais, acabei por o rasgar tal era a minha raiva.
Nat estava emocionada e limpou uma lágrima, tal como eu.
- Desculpa Nat, estou a estragar-te o jantar.
- Nada disso, não o poderia imaginar melhor! Eu é que peço desculpa por te obrigar a estas lembranças do passado.
- É bom lembrar sabes? Mas na verdade é mais um "relembrar", porque eu nunca a esqueci claro, e já me arrependi mil vezes de ter rasgado o bilhete.
Se não o tivesse feito, hoje teria uma recordação sua, e de tão importante, estaria certamente guardada junto com as cartas do meu pai.
- Cartas do teu pai?!!
- Isso é outra história, por agora acho que já chega de nostalgia!
Nat levantou o seu copo e disse:
- Brindemos à alegria, e ao teu primeiro amor!
- Brindemos!
Brindamos precisamente quando no céu passava uma estrela cadente.
- Olha Nat, pede um desejo!
- Já pedi há muito tempo atrás!
- E realizou-se?
- Estranhamente, penso que sim!
- Pensas! Dá cá o teu copo, não bebes mais hoje.
- Posso fazer-te só mais uma perguntinha, para satisfazer a minha curiosidade feminina? Posso?
- Bem, como és a única a quem contei a minha história, está bem!
- É talvez um pouco íntima, se não quiseres não respondes está bem?
- Diz lá!
Nat esperou um pouco como que para ganhar coragem antes de me perguntar:
- O que dizia o tal bilhete? Lembras-te?
Ao dizer isto fez uma cara dramática como os miúdos fazem ao pensarem que vão ser repreendidos.
- Dizia ... o quanto me amava, que não conseguira despedir-se de mim, pedia que a perdoasse garantindo-me que nunca me esqueceria e que tinha com ela tudo o que de mais belo e puro existira entre nós ... enfim, era mais ou menos isto, se não te importas que eu faça um apanhado um pouco generalista.
- Claro, claro! Desculpa mais uma vez, mas sabes como as mulheres adoram estas histórias, e eu não conseguia ficar sem saber o maior segredo.
Sorriu-me emocionada e beijou-me na face despedindo-se.
Dedicado à minha filhota Érica que hoje faz 11 aninhos.
PARABÉNS querida filha.
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1 comentário:
Que bom para ela, um texto lindo de oferta :) Bj
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